Elias Mansur Neto
A
Coréia do norte é um dos últimos bastiões do comunismo. A china já se rendeu,
adotou o capitalismo na sua economia e está enriquecendo. A Rússia, depois de
70 anos de comunismo parece que aprendeu a lição. Cuba já está preparando uma
guinada para o capitalismo. E a Coréia do Norte?
Eis a opinião do Professor Andrei Lankov da Universidade de Koormin, em Seul, Coréia do Sul, publicada no Jornal THE KOREA TIMES, edição de 05/08/2009.
Nesta ultima década tem se verificado um continuo declínio do stalinismo na Coréia do Norte. Sim, enquanto a estrutura política do país permanece claramente estalinista sua economia tem mudado profundamente e talvez irreversivelmente. Isto não foi resultado de uma reforma planejada: pelo contrario, o stalinismo econômico da Coréia do Norte faleceu de morte natural, tendo sido aniquiladas por praticas capitalistas exercidas por parte significativa da população, praticas estas, que começaram a crescer na década de 1990. Mas, é possível uma economia capitalista sem capitalistas? Na Coréia do Norte este processo propiciou o surgimento de uma nova classe de capitalistas que agem no mercado negro.
Obviamente a Coréia do Norte dos anos 1960 e 1980 também tinha ricos e pobres. Mas as pessoas de alto poder aquisitivo tinham este status por escolha da plutocracia estatal (altos funcionários e pessoas que eram autorizadas a trabalharem no estrangeiro e que eram pagas em moeda corrente) ou outras pessoas que recebiam a permissão para ter seu poder aquisitivo aumentado (como era o caso dos repatriados do Japão que recebiam valores em moeda corrente remetidos do exterior). Mas estes não são mais o caso, estamos falando das pessoas que se tornaram ricas nos últimos anos.
O mercado privado começou a crescer explosivamente por volta de 1990, e isto foi quando o “mercado negro” norte coreano foi concebido. Nesta situação para alguém ser bem sucedido é preciso levar vantagem, uma vez que a competição é acirrada. Nos anos 1990 os norte coreanos diziam existir lá somente 03 tipos de pessoas: “os esfomeados, os que pedem e aqueles que fazem comércio”.
De uma maneira geral, tais bem sucedidos empresários vieram de algum negócio ou ocupação anterior onde, de certa forma, levaram vantagens sobre os outros. Muitos deles eram funcionários da burocracia estatal ou gerentes de empresas estatais, onde puderam usar de artimanhas para obterem algum lucro.
Por exemplo, nos anos 1990 uma pessoa que pudesse comandar um caminhão para transporte de distribuição de mercadorias facilmente fazia fortuna explorando as grandes diferenças de preço que existiam entre as regiões. Gerentes de empresas estatais muitas vezes vendiam a produção de suas fabricas no mercado. Isto era tècnicamente um roubo, mas numa sociedade cada vez mais corrupta e desorganizada havia poucas chances de ser descoberto. O pessoal do varejo em todos os níveis procurava receber as mercadorias pelas “portas dos fundos” de suas lojas, longe do sistema público de distribuição em desagregação.
O pessoal das forças armadas e da segurança também tinha suas vantagens, uma vez que, por décadas já vinham operando como se fossem um “estado dentro do estado” além de terem controle sobre os civis.
Finalmente, “a dificuldade de se ganhar dinheiro em moeda corrente” acabou, e eles puderam obter lucros substanciais: tinham habilidade e recursos necessários e vinham operando num quase mercado desde os anos 1970. Após os anos 1990, eles começaram a usar estes recursos em negócios próprios.
Sem contar os oficiais generais e os oficiais de polícia, havia outros grupos de pessoas que se encontravam em posições vantajosas naquele estágio inicial de revival dos norte coreanos capitalistas. Dentre estes, estavam também os repatriados do Japão, cujos parentes que ficaram naquele país foram incentivados a enviar-lhes dinheiro do “inferno capitalista”. Os repatriados tinham dinheiro, e alguns deles tinham também alguma experiência em lidar com a economia de mercado. Outro grupo era constituído de chineses locais, sendo que alguns eram cidadãos chineses e outros eram coreanos que tinham parentes próximos na China. Por décadas eles se dedicaram a atividades de comercio de fronteira e após o colapso do controle do estado, eles aumentaram muito suas operações.
Mesmo algumas profissões mais humildes, como motoristas de veículos encontravam-se em posições relativamente melhores, podendo ganhar dinheiro com transporte de passageiros e de mercadorias, especialmente após a queda das restrições do sistema de viagens, por volta de 1997.
Eles aumentaram seus ganhos também comprando e vendendo mercadorias por eles mesmos. Esta mesma atividade tornou-se também uma fonte de renda para maquinistas de trem. Naturalmente, tiveram que dividir alguns de seus lucros com seus supervisores.
Fortunas foram feitas no comercio e não nas fábricas, as quais permaneceram sob o controle do Estado. Emprestar dinheiro era também uma maneira de se ter bons lucros. Nos anos 1990 os agiotas privados emprestavam dinheiro a juros de 30 a 40% ao mês. Os riscos associados a esta atividade eram enormes, uma vez que tais agiotas não tinham qualquer proteção contra o estado, contra os criminosos, e acima de tudo, contra os maus pagadores. Tinham que escolher seus clientes com o máximo cuidado. Freqüentemente escolhiam funcionários públicos importantes que estavam engajados no comercio privado.
O futuro da Coréia do Norte pertence a estes novos capitalistas? Francamente, eu duvido. Se a Coréia do Norte continuar a existir como um Estado separado do sul, estes aventureiros do mercado terão que competir com os peso pesado da oligarquia estatal, que cedo ou tarde terão que aderir ao jogo capitalista(alguns deles provavelmente já devem ter feito isto). Se o Estado inteiro entrar em colapso e se unir com o sul, a maioria deles será empurrada da classe alta para as classes menos privilegiadas pelo capital que virá de Seul. Mas, por enquanto, teremos que esperar para ouvirmos esta nova estória.
Eis a opinião do Professor Andrei Lankov da Universidade de Koormin, em Seul, Coréia do Sul, publicada no Jornal THE KOREA TIMES, edição de 05/08/2009.
Nesta ultima década tem se verificado um continuo declínio do stalinismo na Coréia do Norte. Sim, enquanto a estrutura política do país permanece claramente estalinista sua economia tem mudado profundamente e talvez irreversivelmente. Isto não foi resultado de uma reforma planejada: pelo contrario, o stalinismo econômico da Coréia do Norte faleceu de morte natural, tendo sido aniquiladas por praticas capitalistas exercidas por parte significativa da população, praticas estas, que começaram a crescer na década de 1990. Mas, é possível uma economia capitalista sem capitalistas? Na Coréia do Norte este processo propiciou o surgimento de uma nova classe de capitalistas que agem no mercado negro.
Obviamente a Coréia do Norte dos anos 1960 e 1980 também tinha ricos e pobres. Mas as pessoas de alto poder aquisitivo tinham este status por escolha da plutocracia estatal (altos funcionários e pessoas que eram autorizadas a trabalharem no estrangeiro e que eram pagas em moeda corrente) ou outras pessoas que recebiam a permissão para ter seu poder aquisitivo aumentado (como era o caso dos repatriados do Japão que recebiam valores em moeda corrente remetidos do exterior). Mas estes não são mais o caso, estamos falando das pessoas que se tornaram ricas nos últimos anos.
O mercado privado começou a crescer explosivamente por volta de 1990, e isto foi quando o “mercado negro” norte coreano foi concebido. Nesta situação para alguém ser bem sucedido é preciso levar vantagem, uma vez que a competição é acirrada. Nos anos 1990 os norte coreanos diziam existir lá somente 03 tipos de pessoas: “os esfomeados, os que pedem e aqueles que fazem comércio”.
De uma maneira geral, tais bem sucedidos empresários vieram de algum negócio ou ocupação anterior onde, de certa forma, levaram vantagens sobre os outros. Muitos deles eram funcionários da burocracia estatal ou gerentes de empresas estatais, onde puderam usar de artimanhas para obterem algum lucro.
Por exemplo, nos anos 1990 uma pessoa que pudesse comandar um caminhão para transporte de distribuição de mercadorias facilmente fazia fortuna explorando as grandes diferenças de preço que existiam entre as regiões. Gerentes de empresas estatais muitas vezes vendiam a produção de suas fabricas no mercado. Isto era tècnicamente um roubo, mas numa sociedade cada vez mais corrupta e desorganizada havia poucas chances de ser descoberto. O pessoal do varejo em todos os níveis procurava receber as mercadorias pelas “portas dos fundos” de suas lojas, longe do sistema público de distribuição em desagregação.
O pessoal das forças armadas e da segurança também tinha suas vantagens, uma vez que, por décadas já vinham operando como se fossem um “estado dentro do estado” além de terem controle sobre os civis.
Finalmente, “a dificuldade de se ganhar dinheiro em moeda corrente” acabou, e eles puderam obter lucros substanciais: tinham habilidade e recursos necessários e vinham operando num quase mercado desde os anos 1970. Após os anos 1990, eles começaram a usar estes recursos em negócios próprios.
Sem contar os oficiais generais e os oficiais de polícia, havia outros grupos de pessoas que se encontravam em posições vantajosas naquele estágio inicial de revival dos norte coreanos capitalistas. Dentre estes, estavam também os repatriados do Japão, cujos parentes que ficaram naquele país foram incentivados a enviar-lhes dinheiro do “inferno capitalista”. Os repatriados tinham dinheiro, e alguns deles tinham também alguma experiência em lidar com a economia de mercado. Outro grupo era constituído de chineses locais, sendo que alguns eram cidadãos chineses e outros eram coreanos que tinham parentes próximos na China. Por décadas eles se dedicaram a atividades de comercio de fronteira e após o colapso do controle do estado, eles aumentaram muito suas operações.
Mesmo algumas profissões mais humildes, como motoristas de veículos encontravam-se em posições relativamente melhores, podendo ganhar dinheiro com transporte de passageiros e de mercadorias, especialmente após a queda das restrições do sistema de viagens, por volta de 1997.
Eles aumentaram seus ganhos também comprando e vendendo mercadorias por eles mesmos. Esta mesma atividade tornou-se também uma fonte de renda para maquinistas de trem. Naturalmente, tiveram que dividir alguns de seus lucros com seus supervisores.
Fortunas foram feitas no comercio e não nas fábricas, as quais permaneceram sob o controle do Estado. Emprestar dinheiro era também uma maneira de se ter bons lucros. Nos anos 1990 os agiotas privados emprestavam dinheiro a juros de 30 a 40% ao mês. Os riscos associados a esta atividade eram enormes, uma vez que tais agiotas não tinham qualquer proteção contra o estado, contra os criminosos, e acima de tudo, contra os maus pagadores. Tinham que escolher seus clientes com o máximo cuidado. Freqüentemente escolhiam funcionários públicos importantes que estavam engajados no comercio privado.
O futuro da Coréia do Norte pertence a estes novos capitalistas? Francamente, eu duvido. Se a Coréia do Norte continuar a existir como um Estado separado do sul, estes aventureiros do mercado terão que competir com os peso pesado da oligarquia estatal, que cedo ou tarde terão que aderir ao jogo capitalista(alguns deles provavelmente já devem ter feito isto). Se o Estado inteiro entrar em colapso e se unir com o sul, a maioria deles será empurrada da classe alta para as classes menos privilegiadas pelo capital que virá de Seul. Mas, por enquanto, teremos que esperar para ouvirmos esta nova estória.
Elias Mansur Neto
Tradução de Elias Mansur Neto
http://www.koreatimes.co.kr/www/news/opinon/2016/10/166_38786.html
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